90 ANOS DE DONA NOÊMIA
Daniel Walker
Segundo o escritor suíço Henri Frédéric Amiel (1821-1881): “Saber envelhecer é obra-prima da sabedoria e uma das partes mais difíceis da grande arte de viver”.
A mulher respeitável, aniversariante do dia 14 deste mês – Dona Noêmia Tenório Figueiredo de Assis – soube fazer isso muito bem e pode ser considerada como expert na arte de viver, razão por que chegou aos 90 anos de gloriosa existência.
Figura muito conhecida na sociedade juazeirense, onde brilhou por várias décadas, a querida aniversariante ainda é dotada de lucidez suficiente para discorrer sobre fatos históricos ocorridos em Juazeiro do Norte, alguns dos quais foi testemunha presencial.
Ela é viúva de João Tenório de Assis ou “João Chita Fina’, como era mais conhecido, pessoa muito ligada à vida social juazeirense do passado, afilhado de Padre Cícero e filho do rico comerciante Cel. Chita Fina.
Em meados de 2002, estando em visita a seus familiares que aqui residem, Dona Noêmia nos concedeu importante entrevista e ao término da mesma ficou patente que suas respostas constituem de fato páginas históricas de Juazeiro do Norte, ameaçadas de cair no esquecimento, mas que através dela foram devidamente resgatadas.
Dona Noêmia se recorda com muita saudade, porém radiante de alegria, das inesquecíveis festas dançantes que agitaram a sociedade juazeirense nas décadas de 30 e 40. Essas festas eram já um resultado positivo da iniciativa de Dr. Floro Bartolomeu da Costa, com o aval de Padre Cícero, que a partir de 1910 conseguiu ativar a vida social da cidade.
Naquelas festas, os rapazes e as moças bonitas da época (Dona Noêmia inclusive) dançavam horas a fio na mais completa harmonia, reflexo de um tempo em que imperavam o respeito e a disciplina.
Sobre as festas cívicas da época, ela fez referência aos bonitos desfiles do Dia da Pátria, quando as escolas com seus alunos elegantemente uniformizados, desfilavam pelo centro da cidade sob os aplausos e admiração das multidões que se formavam para ver o desfile.
De Padre Cícero, de quem é admiradora e devota, guarda boas recordações, todavia jamais conseguiu tirar da lembrança o dia da morte dele, em 1934, segundo ela, o dia mais triste da cidade de Juazeiro do Norte.
Contou-nos que seu marido era freqüentador assíduo da casa do Patriarca, e a ele Padre Cícero deu a incumbência de ler toda noite as notícias dos jornais. Ela informou, com um sorriso maroto, que muitas vezes João Chita Fina já cambaleando de tanto sono, tentava pular alguns trechos das notícias para terminar logo a leitura, mas era prontamente corrigido pelo Padre Cícero, que fazia questão de ouvir as notícias em toda a sua plenitude.
Muita coisa do que Dona Noêmia nos contou está guardada em nosso banco de dados sobre Juazeiro e deverá oportunamente sair a lume sob a forma de artigos ou mesmo num livro que pretendemos publicar.
Felizmente Juazeiro é uma cidade até certo ponto privilegiada por poder contar com figuras como a estimada aniversariante do dia 14. Elas conseguiram a proeza de envelhecer mantendo a lucidez e como cultivaram a sabedoria, na velhice podem funcionar como fontes orais da história da cidade. Aos pesquisadores e historiadores cabe a função de ouvir e registrar o que elas de importante têm para contar. Se o fizerem, os fatos por elas contados não serão esquecidos e passarão a fazer parte dos anais da história com lugar garantido na posteridade.
Como fonte oral, Dona Noêmia é da mesma cepa da qual fazem parte Assunção Gonçalves, Generosa Alencar, Neli Sobreira, Alacoque Bezerra, Terezinha Barbosa, Amália Xavier de Oliveira, Junília Morais, Mundinha Paiva, Luzieta Melo, além de outras, todas merecedoras da nossa maior admiração.
Ao festejar seus 90 anos, bem vividos, Dona Noêmia pode sem nenhum favor, ser reconhecida como um verbete de referência na história de Juazeiro; e como fonte de informação sobre a vida social da cidade, é uma verdadeira enciclopédia.
14.03.2003