VIDA DE ROMARIA
Daniel Walker
“Romeiro de verdade vive na fraternidade”. É assim que diz o bendito cantado nas romarias. E de fato é assim que os romeiros vivem. Tanto nos seus locais de origem como em Juazeiro do Norte, seu destino para alimentação da fé, a fraternidade é a marca registrada das romarias.
Viagem longa e geralmente em estradas malconservadas, calor inclemente dentro de um ônibus ou mesmo num pau-de-arara, nada disso constitui dificuldade para desanimar o romeiro a vir à Terra do Padre Cícero.
A romaria típica tem um ritual específico. Um pessoa idealiza a viagem, convida os participantes e contrata o fretante. De madrugada, num determinado ponto, geralmente uma praça da cidade ou do povoado, ou até mesmo em frente à Igreja, todos se encontram, fazem uma oração e se acomodam no transporte. A viagem começa. Todos têm o rosto radiante de alegria e exprimem isto entoando os benditos que sabem de cor, todos invariavelmente evocando as figuras da Mãe das Dores e do Padre Cícero.
Nas paradas técnicas para refeição, todos descem do transporte e cada um degusta a comida caseira previamente preparada no dia anterior. Isto dura pouco. Reembarcam e a viagem prossegue. Quando sentem que a Terra da Fé se aproxima, a alegria atinge seu ponto máximo e todos cantam mais alegremente, demonstrando a satisfação de estar chegando ao local tão almejado e que consideram sagrado. Muitos ainda vão direto à Igreja de São Francisco e lá o motorista realiza um ritual de chegada que é tradicional: dá três voltas em redor da estátua de São Francisco ao som de uma buzina estridente. Só então descem ao centro da cidade para se hospedar no rancho cujo acerto foi feito com muita antecedência, ou ficam lá mesmo nos Franciscanos onde já existem muitas pousadas.
Guardadas as bagagens, vem o momento seguinte e o mais ansiado: o percurso de visitas que constituem o seu Roteiro da Fé, o qual consiste em visitar as igrejas, o Horto e o túmulo do Padre Cícero. Isto é a espacialidade do romeiro e em nenhuma parte do mundo onde há romarias ela é igual a de Juazeiro. É que aqui existem certas particularidades que só podem acontecer com os romeiros do Padre Cícero e da Mãe das Dores. Mesmo quando estes romeiros visitam outros locais de peregrinação, como Canindé, por exemplo, o que ocorre em Juazeiro não se repete lá. O momento das romarias desta cidade é mágico!
Terminado tudo, pagas as promessas, liquidada a conta nos ranchos é hora de empreender a viagem de volta. E saem cantando: “... Valei-me meu Padrinho Ciço e a Mãe de Deus das Candeias.”
Agora há em todos um misto de alegria e tristeza. Alegria por ter vindo, e tristeza por ter de partir. Mas a tristeza dura pouco, pois já está marcada a viagem de volta e eles então já começam a contar os dias que faltam para o retorno a Terra do Padre /Cícero e das Mãe das Dores.
É assim a vida de romaria.