Este artigo é a Apresentação que escrevi para o livro Surfando nas ondas do rádio, de Luiz Carlos de Lima
APRESENTAÇÃO
Quando a televisão chegou, muita gente acreditou que ela mataria o rádio, pois apresentava um recurso inédito e absolutamente impossível ao rádio − a imagem −, antes em preto e branco e logo depois, em cores. Na verdade, a televisão deu um tiro no rádio; acertou, mas não o matou. Ele reagiu, e embora hoje com raio de penetração mais reduzido, continua no ar. E nos lugares aonde o som e a imagem da televisão não chegam, o rádio ainda impera como rei absoluto.
O rádio faz história no mundo todo. A história do rádio em Juazeiro do Norte é contada neste livro, escrito pelo professor e radialista Luiz Carlos de Lima. É a pessoa indicada para escrevê-lo, por vários motivos: é radialista, é um dos mais atuantes personagens da história da radiofonia juazeirense e tem gabarito intelectual para desenvolver, como de fato desenvolveu, esta empreitada a contento.
Luiz Carlos faz parte do que podemos chamar de segunda geração da Rádio Iracema de Juazeiro, da qual também faço parte, e que se iniciou na década de 60. E somos todos da escola do Mestre Coelho Alves, sem dúvida, o maior ícone da radiofonia caririense, possuidor de uma voz inconfundível, nunca igualada.
Sem querer desmerecer outras épocas, foi certamente na década de 60 que a Rádio Iracema deu o seu mais alto salto de expansão de qualidade. Era uma emissora com grade de programação completa, apta para satisfazer ao gosto mais exigente. No esporte tinha uma equipe digna de fazer bonito em qualquer emissora de rádio do Brasil. E nessa equipe estava uma dupla imbatível formada por Luiz Carlos e José Boaventura, transmitindo partidas de futebol até fora do Estado. No radiojornalismo, as notícias da cidade (modéstia à parte, redigidas por mim) formavam um bloco de destaque, muitas vezes ocupando metade do tempo destinado à edição completa do Grande Jornal Sonoro Iracema. Iderval Pedroso, ouvindo as estações mais potentes do mundo, preparava um noticiário nacional e internacional capaz de deixar os ouvintes atualizados com o que acontecia no Brasil e no mundo. Souza Meneses, com sua crônica diária, imprimia credibilidade ao pensamento oficial da Rádio Iracema sempre focalizando assuntos de real interesse da coletividade. E na linha de musicais, a Iracema tinha uma equipe de apresentadores do tipo “exportação”, daí porque muitos deles migraram para outras emissoras fora da região, tamanho era o seu talento. Luiz Carlos, portanto, viveu os melhores momentos do rádio juazeirense e isso ele conta neste livro, com riqueza de detalhes, para servir de resgate histórico para a posteridade.
Assim como a história de Juazeiro é a própria história de Padre Cícero, também a história do rádio é a própria historia da imprensa local, pois quase todos os jornalistas juazeirenses têm ou tiveram passagem ou foram egressos do radio. No princípio, quando não existia ainda estação de rádio, a imprensa juazeirense iniciada com o jornal O Rebate (1909) teve de formar seu próprio quadro de redatores. Mas depois, com o advento da Rádio Iracema, ou antes disso, com o CRP (Centro Regional de Publicidade), os jornais eram escritos com redatores que já trabalhavam em rádio, como Alceli Sobreira, José Boaventura, Damião Medeiros, Luiz Carlos, Jota Alcides, Wellington Amorim, Geraldo Barbosa, eu e outros. Neste aspecto, a cidade de Juazeiro do Norte tem se caracterizado como sendo uma poderosa plataforma de lançamento de talentos para outras localidades. Daqui, Lourival Marques foi lançado para brilhar no Rio de Janeiro; Jota Alcides, em Brasília; Wilton Bezerra, em Fortaleza; Geraldo Batista, em Campina Grande, afora outros exemplos.
É inegável que o rádio exerce um fascínio extraordinário tanto no locutor como no ouvinte. Ser locutor dá status, principalmente em cidades de pequeno ou médio porte. E os ouvintes ficam felizes quando ouvem seus nomes pronunciados pelos locutores. O rádio também abre portas, dá poder e é um dos grandes formadores de opinião. Por isso é que os políticos gostam tanto de rádio, não como ouvintes, claro, mas como donos. Aliás, o ingresso dessa gente no meio radiofônico terminou sendo um dos grandes responsáveis pelo retrocesso da radiofonia brasileira. Atualmente o número de emissoras nas mãos dos políticos é quase a metade do total das concessões. De modo geral, rádio que tem político como dono tem sua credibilidade sob suspeita porque seus locutores são induzidos a fazer apologia ao patrão, deixando os interesses da coletividade em segundo plano.
Ao tomar a iniciativa de escrever este livro, Luiz Carlos tinha absoluta certeza de que não poderia deixar de traçar um paralelo entre o rádio de ontem e o de hoje, pois viveu as duas épocas, e nelas encontrou nítidas diferenças. Por isso, fez questão de destacar o zelo que o Mestre Coelho Alves imprimia à Rádio Iracema. No tempo de Coelho Alves, locutor tinha de ter voz e saber ler. E era empregado da emissora. Hoje, é diferente. O horário da programação é fatiado entre os próprios locutores, uma prática que traz para a empresa dona da rádio um custo operacional baixo, pois fica livre de muitos encargos sociais, levando-se em conta que locutor que compra horário não precisa ter carteira assinada como empregado. O reflexo desse novo modelo da radiofonia é visível na programação das emissoras, no desempenho dos profissionais, e Luiz Carlos não deixou de mencionar isso neste trabalho.
Outro aspecto digno de registro e que Luiz Carlos também menciona, foi a participação feminina no rádio juazeirense, deste a primeira locutora, por sinal minha prima, Willany Magalhães Almeida, até às revelações da atualidade, cujos nomes são citados pelo autor deste trabalho. Não esqueceu, também, de registrar o impacto na radiofonia juazeirense causado pelo advento das rádios FM, a começar pela liberação do primeiro canal, na origem concedido à Rádio Transcariri (hoje Tempo FM), mas que terminou sendo desdobrado em dois, contemplando também a Rádio Vale FM. Mas isso foi até bom, pois em vez de uma, Juazeiro do Norte ganhou logo duas emissoras, malgrado o fato de serem ambas hoje subordinadas a políticos.
Luiz Carlos dedica boa parte do seu livro para falar do setor esportivo, que é sem dúvida alguma um dos pontos mais fortes na programação de qualquer rádio. O esporte na radiofonia juazeirense é rico em lances históricos, muitos dos quais estão aqui registrados. Luiz Carlos que foi excelente narrador de futebol muda de posição e como historiador conta em seus mínimos detalhes a evolução do esporte na radiofonia juazeirense, destacando nomes de primeira linha, como os de José Boaventura, Wilton Bezerra, Wellington Balbino, Damião Medeiros, Francisco Silva (Foguinho) e tantos outros que não preciso citar, pois ele já o fez. Neste setor o autor fala de cátedra, pois é figura exponencial da radiofonia esportiva juazeirense.
E por fim, nos proporciona momento de hilaridade, ao relembrar gafes cometidas pelos locutores. As gafes citadas por Luiz Carlos é claro que não têm a intenção de denegrir a imagem dos seus autores, pois, afinal de contas, elas foram ao ar proferidas pelos seus próprios autores.
Termino dizendo que este livro deve ser lido por todos os radialistas e por todas as pessoas que gostam do rádio como veículo de informação ou de entretenimento. Ele tem o mérito de ser o pioneiro na região caririense e a importância maior de ter sido escrito por um autor que foi e é personagem da história do rádio juazeirense.
Lendo este livro, estamos todos surfando nas ondas do rádio, juntos com o autor.
Daniel Walker